13.5.06

Amanheça um herói com esplendores do sol. Sempre há-de afectar grandes empresas; mas nos princípios, máximas. Assunto ordinário não pode conduzir extravagante crédito, nem a empresa pigmeia pode acreditar o gigante.

Baltasar Gracián, O Herói (1636)



Dificilmente se poderá contar esta história de uma aventura artística e comunicacional - que nos informa sobre o modo como a música popular urbana floresceu, e estiolou, em Portugal durante os anos 80 - sem a referência contextual ao ambiente social e psicológico em que ela teve origem.

E esse foi o ambiente dos anos 70 – os anos da crise petrolífera, dos resquícios do Maio de 68, das heranças do flower-power, do conflito ideológico, do 25 de Abril, do 28 de Setembro, do 11 de Março, do 25 de Novembro. Havia greves em França e em Inglaterra. Dois activistas da ETA foram condenados à mote por garroteamento - houve manifestações em Lisboa e, na sequência delas, foi assaltada e saqueada a embaixada espanhola. O Papa João Paulo I morreu em circunstâncias estranhas, o Papa João Paulo II veio de uma terra estranha. As Brigadas Vermelhas abalam Itália – o primeiro ministro Aldo Moro foi raptado e assassinado, a gare ferroviária de Bolonha alvo de um atentado bombista. Começou a guerra civil no Líbano. O primeiro ministro português morreu num estranho acidente de avião, até hoje inexplicado. As FP-25 começavam a tornar-se notadas, na esteira de uma série de atentados bombistas levados a cabo por forças de extrema-esquerda, e de extrema-direita.

Eram tempos de guerrilha: a juventude urbana, sobretudo a lisboeta, entretinha-se digladiando-se em batalhas campais, de liceu para liceu. Não havia qualquer ideia de futuro – e a mensagem mais comunal, a certeza mais evidente, era com efeito a palavra de ordem que os punks (uma corrente que, como mais tarde se provou, trazia consigo fortes influências dos situacionistas europeus dos anos 60) haviam lançado a partir de Londres: «No Future».

O grupo Heróis do Mar surgiu, também ele, como um colectivo de intervenção e guerrilha urbana – porém, num sentido estético e simbólico. Eram guerrilheiros do imaginário, da pulsão colectiva, activistas do renascimento dos ideais por meio da comunicação. No fundo, uma pequena companhia ambulante de teatro musical. Não tiveram um nascimento fácil, ou sequer bem compreendido. A sua estreia em palco, em 1981, foi acompanhado por receios de uma intervenção dos Comandos da Amadora na sala – afinal, uma semana antes o grupo havia sido crismado como «fascista» por certa imprensa da época. Revisitar a história dos Heróis do Mar, o modo como conseguiram gerar uma nova atitude para o país, apesar do país, é também uma maneira de analisar o confronto entre as imagens de um Portugal antigo e de um Portugal moderno; ou as relações entre a arte pública e a política. É uma forma de elaborar um balanço provisório das ideias, dos ideais e das dinâmicas que se jogaram na música popular portuguesa da década de 1980. (Excerto do projecto, versão 2003; foto dos HdM no RRV - Peter Machado; título de jornal - Gazeta da Semana, Setembro 1976)

11.5.06

Dois dias depois, com mais um ou outro detalhe
Há pouco mais de um ano...

10.5.06

O que mudou neles? O que mudou em nós? *** Qualificar a emergência de uma geração pós-25 de Abril e pré-Europa, para a qual o exercício partidário do confronto ideológico cedo deixou de fazer sentido, apresentando-se em seu lugar a comunicação por meio de um grupo rock como a primeira experiência possível de europeísmo e de solidariedade, sociabilidade, ou comunicabilidade, internacionais.*** Ilustrar as singularidades da carreira artística em Portugal *** Identificar as peculiaridades da cultura urbana lisboeta moderna e os modos da sua expressão em termos musicais e visuais *** Nem sempre a realidade dá forma à percepção. A percepção dá forma à realidade quando é transformada numa ilusão de massas. (Excertos do projecto original, 2000/2001)